16/09/2025

Receita Federal define tributação de honorários advocatícios em casos de parceria

Por: Arthur Rosa
Fonte: Valor Econômico
A Receita Federal entendeu que as sociedades de advogados, em casos de
parcerias com outras bancas, podem reconhecer como receita bruta, na
apuração do Imposto de Renda (IRPJ), CSLL, PIS e Cofins, apenas a parcela
dos honorários que lhe couber, conforme estipulado em contrato. O valor
repassado ao parceiro poderá ser desconsiderado, segundo o órgão, “desde
que observadas as disposições da legislação tributária vigente e as normas
estabelecidas pelo conselho profissional”.
O entendimento, contido na Solução de Consulta nº 161, editada
recentemente pela Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), é um avanço,
especialmente no ponto relativo ao IRPJ e CSLL no lucro presumido,
segundo especialistas ouvidos pelo Valor. Porém, acrescentam, traz requisitos
não previstos em lei ou que podem acabar inviabilizando o cumprimento da
norma.
Na solução de consulta, a Receita destaca que a Lei nº 8.906, de 1994, o Estatuto
da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), valida, para fins tributários, a
segregação de receitas por sociedades de advogados que atuem em regime de
parceria. No entanto, de acordo com o órgão, a norma estabeleceria que essa
atuação deve envolver o atendimento direto ao cliente por ambas as partes,
“não sendo aplicável a situações em que uma das partes atua exclusivamente
como contratada da outra, sem contato direto com o cliente”.
Para o advogado Breno de Paula, sócio do escritório Arquilau de Paula
Advogados Associados, seria uma interpretação restritiva da lei, que só exige
que as bancas “atuem em forma de parceria para o atendimento do cliente”.
“Não é correto que a interpretação da lei restrinja o conteúdo e a natureza de
como funciona uma parceria, que pode se dar de múltiplas formas, com
múltiplas atribuições, que inclusive podem mudar de acordo com o tempo e
com a necessidade do caso”, afirma.
O especialista cita ainda outro ponto que considera polêmico, o que exige que
o contrato de parceria, com vários detalhes, seja “averbado à margem do
registro da sociedade em cada Conselho Seccional da OAB”. A medida, com
base em provimentos da OAB, diz ele, precisa ser revista pelo Conselho Federal
“para adaptá-la à realidade da atividade e às múltiplas formas de parcerias”.
“As parcerias são estabelecidas entre as partes de múltiplas maneiras e não
necessariamente com essas todas essas formalidades. A realidade que se impõe
é que um simples texto ou áudio formaliza a parceria. Inclusive muitas vezes
nem é necessário tratar previamente, já que a parceria é longeva. O ajuste pode
se dar ao final, sendo formalizado, justamente, quando da entrega dos valores
ao parceiro”, diz ele.
Outro ponto da solução de consulta questionado por especialistas é o que
estabelece que “somente a parcela do IRRF proporcional aos honorários
reconhecidos como receita bruta própria pela consulente poderá ser
aproveitada para fins de dedução do IRPJ apurado com base no lucro
presumido”. “Esse ponto é evidentemente incorreto, já que subtrai
indevidamente tributo pago. Basta assegurar o crédito integral, já que o tributo
devido nesta operação será integralmente adimplido por ambas as partes”,
afirma Breno de Paula.
Presidente da OAB, Beto Simonetti diz, em nota enviada ao Valor, que a
decisão da Receita é um avanço. Mas que, para que seja plenamente operacional,
ainda é preciso aprimorar pontos práticos: a exigência de atendimento conjunto
ao cliente, a burocracia na averbação de contratos e a regulamentação das notas
fiscais para o fracionamento do IRRF.
Para que a decisão seja plenamente operacional, é preciso aprimorar pontos
práticos”
— Beto Simonetti
“Ou seja, não há um empecilho que inviabilize a medida, mas ajustes
necessários para que funcione de forma efetiva em todo o país. A entidade
continuará trabalhando para que a regulamentação avance e para que essa
realidade legislativa seja plenamente operacional e viável para os escritórios em
todo o país, afirma Simonetti.
Para ele, a solução de consulta “reflete o avanço legislativo promovido no
Estatuto da Advocacia, que passou a reconhecer as parcerias entre escritórios
como um instrumento legítimo de organização da profissão”. “Em um mundo
que exige cada vez mais especialização, sem perder de vista a confiança do
cliente no advogado, a Receita Federal confirma que cada parceiro deve assumir
a responsabilidade tributária pela sua parte nos honorários. Isso traz segurança
jurídica, adequação à realidade do mercado e representa uma vitória importante
para a advocacia e para a sociedade”, diz.
João Pedro Strambi, advogado tributarista do VBD Advogados, também
destaca que o entendimento manifestado pela Receita Federal “estabelece uma
diretriz mais clara para as sociedades de advogados, especialmente por
reconhecer a validade do Estatuto da OAB para fins tributários”. Temas
envolvendo modelos de repartição de receita, diz, “sempre geram dúvidas ao
contribuinte e interpretações conflitantes”.
Ele lembra que a Receita já havia sinalizado nesse sentido quando disciplinou a
exclusão dessas receitas da base de cálculo do PIS e da Cofins (regime
cumulativo), conforme Instrução Normativa RFB nº 2264, publicada em abril
de 2025. “Com a solução de consulta, fica esclarecido o tratamento que o Fisco
considera correto também para o IRPJ e para CSLL, no caso das sociedades
optantes pelo lucro presumido”, afirma ele, acrescentando, contudo, que a
formalização e averbação do contrato de parceria junto à OAB é um ponto de
atenção e que a restrição pode gerar novos questionamentos.
“A Receita faz menção a provimentos do Conselho Federal da OAB que não
se relacionam diretamente com a questão tratada. O Provimento nº 204/2021,
que efetivamente trata do assunto e também foi citado pelo Fisco, não faz
nenhuma referência à necessidade de averbação, indicando que a repartição
seria comprovada somente pela apresentação do contrato”, diz.
Procurada pelo Valor, a Receita Federal não deu retorno até o fechamento da
edição.